sexta-feira, 30 de maio de 2008

CRIL na Assembleia da República


Sr. Presidente, Srs. Deputados,
Em Novembro de 2007, foi adjudicada a construção do último troço da CRIL – Circular Regional Interna de Lisboa - entre a Pontinha e a Buraca. Como todos de certo reconhecemos, trata-se de uma obra importante para a circulação rodoviária da cidade de Lisboa, mas também importante para a restante Área Metropolitana. Trata-se de 3,7 km, que permitirão concluir a obra global que é a Circular Regional Interna. Contudo, a importância e a necessidade na celeridade da execução desta obra, não pode implicar atropelos, quer às questões ambientas, quer à salvaguarda dos interesses dos cidadãos que residem junto ao traçado, quer à própria segurança rodoviária desta futura infra-estrutura viária. Constata-se, no entanto, que a obra adjudicada não cumpre a Declaração de Impacte Ambiental, designadamente, para a zona que atravessa os bairros de Santa Cruz e da Damaia, uma vez que não se está a dar cumprimento às várias condicionantes que sustentam o parecer favorável da DIA, nomeadamente, ao atravessamento desta zona em túnel. Ora aquilo que hoje está previsto executar, não se trata de um atravessamento em túnel mas sim em canal aberto, ocorrendo também um aumento do número de faixas de rodagem, que eram de três para cada lado, para quatro vias em cada sentido. Isto mesmo já foi confirmado pela Agência Portuguesa do Ambiente que, em carta dirigida aos moradores, afirma que a presente solução não cumpre com a referida Declaração de Impacte Ambiental. Tal violação da DIA coloca em causa a qualidade de vida dos cidadãos que residem nesta zona, afectando a qualidade do ar e elevando os níveis de ruído, mas também, colocando uma barreira física à circulação dos moradores, para além de não permitir a requalificação e o aproveitamento desta área como uma zona de lazer.


Estas alterações, nomeadamente o aumento das faixas de rodagem, implicarão, ainda, a demolição dos quintais de dezenas de vivendas que passarão a viver paredes meias com o referido canal, onde se prevê que possam circular cerca de 120 mil veículos diariamente. Tal situação, para além de representar aquilo que já vem sendo corrente da parte deste Governo, de desrespeito pelos estudos de avaliação de impacte ambiental e pelo que dai é emanado, representa um desprezo e uma desvalorização da participação dos cidadãos nas consultas públicas que, no caso, recebeu mais de mil contributos. Quando hoje se fala do alheamento dos cidadãos e da falta de participação na vida cívica, não deixa de ser significativo que, depois de uma ampla participação no processo de consulta pública, se venha executar aquilo que não corresponde ao que ficou previsto. Sr. Presidente, Srs. Deputados, Entretanto, e ao nível da segurança rodoviária, o Observatório de Segurança de Estradas e Cidades (OSEC) elaborou um estudo sobre este traçado, onde conclui que o mesmo representa um perigo concreto para a vida ou integridade física dos futuros utentes desta via. Segundo o Observatório, no traçado acumulam-se as situações de incumprimento às normas de segurança, nomeadamente: curvas apertadas que não são compatíveis com as velocidades previstas; curvas com inclinação insuficiente para contrariar o efeito da aceleração centrífuga; curvas em lombas que impedem que o condutor veja atempadamente eventuais obstáculos na via; necessidade de reduções bruscas na velocidade de rolamento devido ao traçado; entre outras. Tal situação coloca em causa, segundo o Observatório, a circulação rodoviária a uma velocidade compatível com aquilo que é esperado para uma via deste tipo, classificada como IC - Itinerário Complementar, o que, a ser verdade, colocará em causa, por sua vez, a própria função e objectivos deste investimento público que, segundo se sabe, custará aos cofres do Estado 110 milhões de euros. Segundo o Observatório, as deficiências são tais que se terá de limitar a velocidade, em grande parte do troço, aos 60 e 70 km/h. Ocorre ainda que a opção sobre este traçado foi efectuada em detrimento de outras opções, nomeadamente pela zona da Falagueira/Venda-Nova, o qual foi também objecto de uma proposta de traçado por parte da empresa COBA. Em nosso entender, esta alternativa apresentaria inegáveis vantagens, quer na salvaguarda do interesse das populações, uma vez que não atravessaria urbanizações já instaladas, quer na salvaguarda da segurança rodoviária e da própria função desta obra pública, uma vez que permitiria que todo o traçado se desenhasse numa curva larga, ao invés, de se “serpentear” pelo meio do património edificado.

Sr. Presidente, Srs. Deputados,
Para “Os Verdes”, tendo em conta a credibilidade que o Observatório de Estradas nos merece e pelo que está em causa, é obrigatório que o Ministério das Obras Públicas rebata as conclusões deste estudo, ou, a ser verdade, que corrija o traçado, sob pena de vir a ser responsabilizado pela sinistralidade que ali venha a ocorrer. Já no que respeita à violação do que está estabelecido na Declaração de Impacte Ambiental, “Os Verdes” consideram que se continua a não entender que as obras públicas se fazem para trazer melhor qualidade de vida aos cidadãos e não para funcionarem como uma manta que, quando cobre a cabeça destapa os pés e quando tapa os pés descobre a cabeça. Hoje melhora-se a circulação rodoviária prejudicando a qualidade de vida de centenas de cidadãos, amanhã, terá de se investir em medidas minimizadoras desses impactes e na requalificação da zona afectada, mais tarde, falaremos na reposição do passivo de saúde pública provocado pelas obras presentes.

Declaração Política do Deputado José Miguel Gonçalves (PEV)
proferida na Assembleia da República a 28 de Maio de 2008
Foto: 2rosas

quarta-feira, 21 de maio de 2008

Não nos calaremos ….

Na primeira noite, eles aproximam-se
e colhem uma flor de nosso jardim.
E não dizemos nada…

Na segunda noite, já não se escondem,
pisam as flores, matam o nosso cão.
E não dizemos nada…

Até que um dia, o mais frágil deles,
entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a lua,
e, conhecendo o nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E porque não dissemos nada, já não podemos dizer nada.

Maiakovski (1893-1930)


Gostava que este grito se amplificasse…
Não gostaria de ser acusado de não ter dito nada… e já ser tarde de mais.
Será difícil de perceber que o último troço da cril é uma obra de interesse público que afecta milhares de cidadãos e não é apenas um “projectozinho” do interesse da Câmara da Amadora ou da Câmara de Lisboa?

Como é possível que o interesse privado se sobreponha ao interesse público?
Porque querem abafar este caso e silenciá-lo?

Como é possível ninguém querer ver o que é óbvio?
- até quando?...

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Carta aberta a Sua Excelência o Sr. Presidente da República Portuguesa


Assunto: Projecto do “IC17 - CRIL – SUBLANÇO BURACA / PONTINHA”

Excelentíssimo Senhor
Presidente da República Portuguesa
Prof. Cavaco Silva


Sabemos que conhece a nossa causa.

Ao longo dos anos, temos desenvolvido uma consiência cívica que nos tem levado a agir, quer no âmbito dos nossos problemas locais, quer no dos impactes que a todos afectam. Assim, temos vindo a exigir uma CRIL segura, com mobilidade, que respeite o Ambiente e as populações.

Sabemos que deseja que os Cidadãos contribuam para a evolução da Democracia. A nossa participação tem sido exemplar: quatorze anos de luta contra os maus projectos e abusos do Estado, e a favor de uma estrada bem projectada, que sirva bem a Área Metropolitana de Lisboa.

O projecto actual veio alterar o projecto de 2004. A Declaração de Impacte Ambiental emitida em 2004 não foi cumprida no projecto actual, o que é ilegal. O instituto do Ambiente confirmou esta situação e foi afastado do processo de avaliação, o que é imoral. Pusemos o Estado em tribunal e o processo foi recusado com base em fundamentos legais falsos, o que é infame.

A intervenção de V. Exa. nesta fase é a última esperança duma acção política decente.
Queremos que faça valer os Direitos dos Cidadãos.

Respeitosos cumprimentos
Os Moradores

Lisboa, 15 de Maio'08

quarta-feira, 14 de maio de 2008


VIGÍLIA EM BELÉM
Pelos nossos Direitos e respeito pela Lei

Caros Cidadãos,

Na próxima 5ª Feira, 15 de Maio, a partir das 19:30h
vamos fazer uma vigília em Belém,
em frente à residência oficial de Sua Exa. o Sr. Presidente da República.

Exigimos uma CRIL segura, amiga do Ambiente e que respeite as Populações.

PARTICIPE, TRAGA UMA VELA E UM AMIGO.

Cidadãos Responsáveis i Livres
por uma melhor cidadania

sexta-feira, 9 de maio de 2008

Grande Entrevista - A Cril da discórdia


Interesses privados sobrepõem-se aos interesses públicos

Jorge Alves é o rosto visível de um combate que opõe governo e autarquias às populações preocupadas com o traçado da CRIL. Lena d’Água, que viveu décadas no Bairro de Santa Cruz, junta-se ao movimento e dá a cara por este grito [já] rouco da cidadania

O actual projecto da Circular Rodoviária Interna de Lisboa (CRIL), adjudicado em Novembro pelo governo, é um atentado, segundo o Movimento de Cidadãos “Força Cidadania”, contra a qualidade de vida das populações de Santa Cruz, Benfica, Damaia e Alfornelos, implicando até a destruição parcial do emblemático e patrimonial Bairro de Santa Cruz, violando de forma grosseira a Declaração de Impacte Ambiental, avalizada por pareceres do Instituto do Ambiente que, entretanto, foi afastado de todo processo.
Estranhamente, o actual projecto viola compromissos assumidos com a população por todos os partidos com acento na Assembleia Municipal de Lisboa, e não tem em conta outras soluções mais lógicas, vantajosas e eficazes para a defesa da qualidade de vida dos cidadãos, do ambiente das zonas envolventes e da própria segurança rodoviária.
Os cidadãos, organizados em torno desta plataforma, alertam para o facto de “uma negociata entre as Câmaras de Lisboa e Amadora” ter decidido nas costas das populações, fazendo prevalecer interesses privados sobre o interesse público.

CC - Este problema arrasta-se desde 1994. E imagino que isto tenha surgido como um “murro no estômago”.
Jorge Alves - Nessa altura apercebi-me de uma coisa que já era vista como um facto consumado, e que era a destruição do Bairro de Santa Cruz. O projecto inicial previa a passagem de um viaduto por cima do bairro, destruindo toda essa zona. A minha primeira reacção foi avisar os vizinhos, de moto próprio decidi redigir um comunicado sob o título “Querem destruir o Bairro de Santa Cruz”. Meti-o nas caixas de correio e, como era previsível, as pessoas reagiram. Foi o tal “murro no estômago”.
CC - Mas esta é umareferência ao primeiro traçado, porque agora há outro que, ao menos, não passa por cima, passa por baixo “às arrecuas”…
Jorge Alves - Mas essa foi a primeira vez em que as pessoas tiveram consciência de que iria ali passar a CRIL. Que, aliás, era uma coisa que já estava definida desde 69. Só que nesse corredor foram-se construindo prédios, não só em Santa Cruz, mas
também em Alfornelos e noutros sítios. E, cumprindo-se o actual traçado, vai ser terrível para os moradores dessas zonas já consolidadas. É o caso de Santa Cruz, da Damaia, das Pedralvas, de Alfornelos…
A previsão é que irá arrasar com a qualidade de vida de mais de 40.000 pessoas, passando por esta zona mais de 120 mil veículos por dia. E isto, em termos de qualidade do ar e do ruído, é inaceitável. Aliás, há coisa de um mês e meio, estudos da Organização Mundial de Saúde referem que estradas de grande tráfego são consequentemente responsáveis por elevadíssimo número de mortes.
CC - Um dos vosso argumentos é o de que este traçado enferma de ilegalidade.
Jorge Alves - Para este tipo de vias há recomendações técnicas e normas que têm de ser cumpridas. E têm a ver com os aspectos da mobilidade e da eficiência rodoviária e, também, com os problemas de segurança. Uma estrada destas não se pode fazer de qualquer maneira. E, para além disto, deve haver padrões de compatibilidade entre a estrada e as populações.
Preservando a qualidade de vida, para que se faça a obra com o mínimo de impacto. E, precisamente, para criar esse equilíbrio entre o que é o interesse dos cidadãos e o interesse da obra, é que é instituída a consulta pública e a participação
das pessoas, para que os cidadãos possam falar, mostrar as suas preocupações. E é dentro desta cultura que se vão encontrar soluções sustentadas.
CC - E onde está a ilegalidade?
Jorge Alves - Está precisamente na circunstância de a obra não ter seguido estes critérios. Quer dizer, houve as consultas públicas, a última em 2004,mas tratou-se de um mero pró-forma. E esse último arremedo de consulta teve a participação de mais de mil pessoas individuais e organizações, mas tudo isto não foi tido em conta. Em matéria de segurança rodoviária, por
exemplo, este traçado adjudicado pelo governo viola de forma grave critérios de segurança.
Lena d’Água - É como se não houvesse ninguém lá a morar.
Jorge Alves - E esta violação - nem somos só nós a dizê-lo… Há estudos técnicos que dizem isso, e contra estudos técnicos não há semântica política que valha. E, para além disso, atenta contra as populações em todo o traçado.
Lena d’Água - E vão trancar o Bairro 6 de Maio, com os meus padrinhos lá metidinhos no meio, coitadinhos. Ficam lá metidos na Damaia, sem já terem saída por cima por causa do IC 19. E, depois, há o Bairro de Santa Cruz onde, mesmo fazendo um túnel…
Jorge Alves - O túnel resolvia o problema.
CC - Há uma coisa que li, se não estou em erro um parecer da Câmara da Amadora, onde se diz uma coisa extraordinária. A de que este traçado vai favorecer novas urbanizações… O que é uma coisa incrível!
Jorge Alves - Exactamente. Mas falemos de quais devem ser os padrões de orientação para um projecto destes. Tem que se ter em conta a qualidade de vida das populações, a segurança rodoviária, a mobilidade – se não a estrada não serve para nada, porque ela é feita para os carros andarem, para resolver problemas. E, neste projecto, nada disto é tido em conta. E porquê?
Porque é um traçado aos esses – e o facto de ser aos esses e com inclinações incorre nas tais violações dos critérios de segurança. O que se constituiu em mais uma estrada da morte.
CC - Nem é preciso ser especialista para se perceber isso. Basta só olhar para o traçado.
Jorge Alves - Isto é tão mais grave, porque estamos a assistir a várias coisas. Como já disse, não se respeitam elementares critérios de segurança, vai-se construir uma estrada que não vai resolver os problemas de mobilidade, porque uma das recomendações para estradas deste tipo, com três vias para cada lado, é existirem nós distanciados entre si por 3 ou quatro quilómetros e, a existirem, devem ser nós que ligam a vias de igual nível, porque a não ser assim vai-se verificar enorme funilamento de tráfego. Neste traçado, estão meia dúzia de nós, sendo que nenhum deles cumpre estas características.
E isto vai fazer com que o tráfego se avolume, à saída, em cima da via. Além domais, aquilo que dizem ser túneis não passa de valas abertas. Portanto, este projecto, logo à partida, enferma destes problemas todos. E tão mais grave é isto, quando poderia ser evitado. Podia-se ter feito um traçado direito – e existem terrenos para isso.
CC - Ressalta de tudo isto, que se trata da cultura do betão a vingar…
Jorge Alves - Exactamente. Está a rebentar pelas costuras a falta de respeito pelas populações, a leviandade política com que se trata estes assuntos. É um traçado aos esses, para beneficiar interesses imobiliários, quando podia ser feito a direito, um traçado lógico [ver imagem] em terrenos livres. Impõe-se um traçado atirado literalmente para cima das populações, quando
existem condições para o fazer a direito sem afectar a qualidade de vida dos cidadãos. Ainda para mais, quando os terrenos livres são propriedade do Estado.
CC - Então, mas os engenheiros não sabem fazer traçados a direito? Têm alguma alergia aos terrenos livres para construírem estradas?
Jorge Alves Até parece que sim. Mas a parte grave da questão é que isto é uma obra de interesse público e, neste momento, isso não se verifica porque para todos estes terrenos livres existem grandes projectos imobiliários. E, quando se fala em projectos imobiliários, estamos a falar de uma concessão maior do que a cidade de Bragança.
CC - São os novos empreendimentos de que fala o parecer da CâmaraMunicipal da Amadora?
Jorge Alves - Exactamente. Todos estes terrenos são para grandes projectos imobiliários acobertados pelos poderes públicos municipais. Estamos a falar de uma área de construção de 1 milhão e 500 mil metros quadrados. Uma das poucas zonas verdes do concelho da Amadora vai ser invadida pelo betão.
Lena d’Água - Em vez de construírem a estrada numa zona onde não vive ninguém, vão rasgar ao meio o Bairro de Santa Cruz. Mas isto faz algum sentido? Eu não acredito…
Jorge Alves - A lógica é o extermínio de uma zona verde para dar vez à especulação imobiliária de que o Estado se torna agente.
CC - O traçado a que vocês chamam alternativo, foi o proposto por entidades absolutamente insuspeitas.
Jorge Alves Este traçado foi o proposto logicamente por qualquer cidadão que olhasse para o mapa. No entanto, nós sabemos que foram desenvolvidos estudos sobre este traçado, só que estão dentro da gaveta. Não houve interesse…
CC - Até do ponto de vista do erário público, este traçado sairia mais barato?
Jorge Alves Provavelmente. Até porque os terrenos livres são propriedade do Estado, o que evitaria os nós do actual projecto, os muros de contenção [que chegam a ficar mais caros do que um túnel] e as respectivas indemnizações por expropriação.
O que é uma obra de interesse público, que deveria resolver os problemas de mobilidade e segurança, transformou-se numa estrada de serventia de umamega urbanização, ou de várias urbanizações. E isto para valorizar os interesses imobiliários. A CRIL transformou-se numa infra-estrutura para que grande parte destes apartamentos, construídos nesta zona, venham a ser vendidos por mais 15, vinte ou trinta porcento. Isto é tão real, que o projecto da Falagueira – e o relatório que o acompanha – tem partes onde se diz, por exemplo, que o nó da Damaia é um factor de sucesso para a valorização destes empreendimentos. E, portanto, vemos o Estado, com o dinheiro dos contribuintes, promover um atentado contra as populações e o ambiente para valorizar empreendimentos imobiliários, a favor de uma pequeníssima elite dos interesses. Ou seja, é o Estado o promotor da especulação imobiliária. E isto não diz respeito só às pessoas que vivem nestas zonas, diz respeito a todos os que contribuem
para os cofres do Estado.
CC - E tem a ver com cidadania.
Jorge Alves - Claro. Por isso é que temos vindo a desenvolver uma consciência cívica, porque acima disto está uma coisa muito mais importante. E trata-se, acima de tudo, não de defender os nossos interesses mas, outrossim, os nossos direitos. E o que nos preocupa é esta mentalidade dominante de tratar mal os cidadãos e, em nome do interesse público, fazerem-se todos estes disparates. Esta é uma cultura política que tem de ser alterada rapidamente.
CC - E parece haver uma campanha de mistificação, de branqueamento deste aborto de projecto. E estou a referir-me às imagens difundidas pelo governo, onde se apresenta o projecto de uma perspectiva mais favorável e manipuladora.
Jorge Alves- A gravidade disto é tão evidente, que os responsáveis políticos que deram o aval a isto – tendo consciência da sua gravidade – tentam esconder esta realidade. E, então, para esse efeito, não se coíbem de manipular imagens, de fazer fotomontagens distorcidas, de proferirem declarações técnicas desprovidas de verdade, de fazerem toda uma campanha apresentando isto como um projecto pioneiro. Como, aliás, aconteceu no dia da adjudicação, a 16 de Novembro, em que com uma grande pompa e circunstância, com palanque e tudo, onde o ministro das Obras Públicas, o primeiro-ministro, os presidentes das câmaras, teceram elogios a este traçado. E a obra, sendo adjudicada ao 7º concorrente, por mais 16 milhões de euros [não por questões de favorecimento, dizem – mas por razões de qualidade técnica] … E, cinco dias depois, quando o Observatório de Segurança de Estradas e Cidades apresenta um estudo a denunciar os graves problemas deste traçado, e os seus vários pontos negros, foi surpreendente ouvirmos o presidente da Estradas de Portugal dizer que aquilo era só um estudo e não se pode falar de um projecto que não existe. Ora, se aquilo é um projecto que não existe, o que é que aqueles senhores todos, no dia da adjudicação, estavam a fazer em cima do palanque e, mais que isso, a falar sobre quê?
CC - Este traçado aos esses deve ser para apelar à prática de desportos radicais…
Jorge Alves Além de ser aos esses, é uma espécie de carrossel. Por exemplo, a curva 4 é uma espécie de looping. Este traçado é tão mau que vai ser obrigatoriamente imposta uma velocidade de 60 quilómetros/hora e controlada por radares,nem vai ser por sinalética vertical – e estamos numa extensão de 3, 7 quilómetros. Isto é do conhecimento de toda a gente, mas parece não haver nenhuma preocupação de quem tem a capacidade de decidir.
CC - Ó Lena, isto é como uma espécie de violação das tuas memórias de infância.
Lena d’Água Estou-me nas tintas. As minhas memórias de infância já ninguém as tira, essas são minhas. E isso é o passado. Agora, este é um presente execrável. E estamos a ver o que se faz por cima de pessoas que estão pacatamente nas suas
vidas. E é por causa de coisas destas que as pessoas cada vez votam menos, já não acreditam. Até há pouco tempo atrás, eu não pensava ser possível fazerem-se aberrações deste género, ainda para mais havendo um terreno vazio.
Jorge Alves Inclusive, nós pedimos um parecer ao Instituto do Ambiente que, aliás, nos forneceu três, e onde expressamente declara não se ter respeitado a declaração de impacte ambiental. E o Ministério das Obras Públicas, em função de pareceres, de um organismo do próprio Estado, decidiu dispensar o Instituto do Ambiente de todo o processo. E, nesta matéria, não há entidade mais avalizada para se pronunciar do que o Instituto. E os tribunais dão cobertura às ilegalidades, indeferindo acções por “razões processuais” sem qualquer fundamento. O poder judicial, neste momento – e por incrível que pareça –, não está interessado em fazer cumprir a Lei.
Lena d’Água Mas eles não cedem porque, no caso de Santa Cruz, sabem tratar-se de uma população envelhecida, de velhotes a caminho da farmácia e da fisioterapia, sem força, nem vontade, nem, esperança.
Jorge Alves Exactamente.
CC - O que é que se pode fazer?
Jorge Alves Isto é um problema de cultura democrática. Os cidadãos são responsáveis por não participarem, por permitirem que os outros decidam por eles. A falta de preocupação das pessoas é que leva a que gente desta decida nas suas costas.

Jornal "Conversas de Café" (CC)
9 de Maio de 2008

quarta-feira, 7 de maio de 2008

MANIFESTO

Nós Cidadãos livres de Santa Cruz de Benfica e Damaia cumpridores dos nossos DEVERES perante o Estado exigimos respeito pelos nossos DIREITOS

Tendo em conta que o actual projecto adjudicado pelo Governo para a conclusão da CRIL:

1. Atenta de forma grave contra a qualidade de vida de toda uma população;
2. Implica a destruição de parte do Bairro de Santa Cruz;
3. Viola de forma grosseira a Declaração de Impacte Ambiental, comprovada por pareceres do próprio Instituto do Ambiente;
4. Faz tábua rasa da participação dos Cidadãos nas Consultas Públicas;
5. Vai contra os compromissos assumidos com a população por todos os partidos políticos, através das moções em sede de Junta de Freguesia de Benfica e Assembleia Municipal de Lisboa;
6. Ignora outras soluções projectuais existentes, que apresentam inegáveis vantagens para as populações, seja em termos ambientais ou rodoviários;

Tendo também em conta:
1. A incapacidade do Sr. Presidente da Câmara Municipal de Lisboa e dos vários responsáveis políticos para tomarem uma posição cabal que defenda os munícipes e o Interesse Público;
2. O facto de todos os contactos estabelecidos até à data com Sua Excelência o Sr. Presidente da República, Prof. Cavaco Silva, não terem surtido qualquer efeito;
3. A “dificuldade”dos tribunais para tomarem uma posição em defesa da lei, evitando o julgamento de um projecto que se sabe ser ilegal, por violar a Declaração de Impacte Ambiental;

Considerando ainda:
1. Que o motivo de todos estes atropelos, como temos alertado inúmeras vezes, se deve a interesses imobiliários promovidos pela Câmara Municipal da Amadora, que tem agido no exclusivo interesse de uma elite minoritária, em total desrespeito pelo Ambiente, pela segurança rodoviária e pela qualidade de vida de milhares de Cidadãos;
2. As recentes declarações do Sr. Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Dr. António Costa, na J. F. Benfica, quando referiu que o problema é, passamos a citar, “o Concelho da Amadora negociou bem e o Concelho de Lisboa negociou mal”…
3. Que uma simples “negociata” entre as Câmaras de Lisboa e da Amadora decide em nome dos Cidadãos, contra o seu património e contra a sua qualidade de vida, aprovando um projecto que a todos prejudica!

Conclui-se que:

1. Quando as populações perdem a confiança no Estado de Direito, na capacidade deste fazer valer os Direitos dos Cidadãos através de decisões honestas e ponderadas, então SÓ RESTA ÀS POPULAÇÕES DEFENDEREM OS SEUS PRÓPRIOS DIREITOS!
2. Como é referido no Artigo 21º da Constituição Portuguesa (Direito de resistência):
“Todos têm o direito de resistir a qualquer ordem que ofenda os seus direitos, liberdades e garantias e de repelir pela força qualquer agressão, quando não seja possível recorrer à autoridade pública”.
3. Como é referido na Declaração Universal dos Direitos do Homem:
“É essencial a protecção dos direitos do homem através de um regime de direito, para que o homem não seja compelido, em supremo recurso, à revolta contra a tirania e a opressão”

Deste modo, e parafraseando Mário Soares, reiteramos:
“Quando nos sentimos injustiçados, todos temos o direito à indignação”.
Cidadãos Responsáveis i Livres